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18.6.15

MARIA SABINA




[...] eu sou a mulher das letras, diz
eu sou um livro mulher, diz
ninguém consegue fechar meu livro, diz
ninguém pode tirar de mim meu livro, diz
meu livro encontrado debaixo d’água, diz

meu livro de orações


Velada da madrugada - fragmentos - tradução de Reuben da Rocha. Via Gratuita Vol 2 - Atlas.

9.1.15

A estética do oprimido - Augusto Boal (2009) - trechos

Como é possível defender a multiplicidade cultural e, ao mesmo tempo, a ideia de que existe apenas uma estética, válida para todos? Seria o mesmo que defender a democracia e, ao mesmo tempo, a ditadura

A castração estética vulnerabiliza a cidadania obrigando-a a obedecer mensagens imperativas da mídia, da cátedra e do palanque, do púlpito e de todos os sargentos, sem pensá-las, refutá-las, sequer entendê-las!

O analfabetismo estético, que assola até alfabetizados em leitura e escritura, é perigoso instrumento de dominação que permite aos opressores a subliminal Invasão dos Cérebros! As ideias dominantes em uma sociedade são as ideias das classes dominantes, certo, mas, por onde penetram essas ideias?

Pelos soberanos canais estéticos da Palavra, da Imagem e do Som, latifúndios dos opressores! É também nestes domínios que devemos travar as lutas sociais e políticas em busca de sociedades sem opressores e sem oprimidos. Um novo mundo é possível: há que inventá-lo!

***
 ... avanço duas teses principais: 1 — existem duas formas humanas de pensamento – Sensível e Simbólico –, e não apenas esta que se traduz em discurso verbal. São formas complementares, poderosas, e são, ambas, manipuladas e aviltadas por aqueles que impõem suas ideologias às sociedades que dominam; 2 — como todas as sociedades estão divididas em classes, castas, etnias, nações, religiões e outras confrontações, é absurdo afirmar a existência de uma só estética que a todos contemple com suas regras, leis e paradigmas: existem muitas estéticas, todas de igual valor, quando têm valor.

***

Quando exercido pelos oprimidos, o Pensamento Sensível é censurado e proibido – eles não têm direito à sua própria criatividade: máquina não cria. Aperta-se um botão... e produz. Podem também ser usados como macaquinhos de realejo em programas de auditório...

***

Rosa Luxemburgo escreveu que o primeiro ato revolucionário é chamar as coisas pelos seus verdadeiros nomes. É verdade! Por que não se quer ouvir a verdade?

***

O Conhecimento acumula; Pensamento é aventura. O Conhecimento traz o passado até o instante presente; o Pensamento, do instante, permite avançar para o futuro ou revisitar o passado.

Conhecer, Conhecimento e Pensamentos são níveis e modos de um mesmo processo psíquico. O Conhecimento não é uma estática estante de livros, depósito: é vivo e pulsativo, memória e esquecimento, acendeapaga. Palavras ao vento não deixam registro, mas intensos prazeres e dores repetidas, sim. Frases reiteradas deixam sua marca. Imagens revisitadas, sua prensa. Sons, ecoam. Conhecimento é Memória ativa. Pensamento é ação.

***

O Belo, que da Estética faz parte, é a organização da realidade, anárquica e aleatória, em formas sensoriais que lhe dão sentido e, a nós, prazer. Belo não é só o que nos alegra e agrada, mas também o que nos assusta e consterna, como a beleza de uma catástrofe natural, como um
tsunami, ou a bomba atômica, que explode em cogumelo.

O feio, antônimo apenas de bonito, pode ser belo. Guernica, de Picasso, é bela obra de arte que nos mostra horrendo crime histórico, feio e trágico, tal como a destruição de Rotterdam, Hiroshima, Nagazaki e outras cidades sem nenhuma importância militar. O Morto, de Cândido Portinari, mostra os terrores da guerra em bela e feia imagem, tinta de sangue; seu famoso Tiradentes esquartejado mostra os horrores do colonialismo. Belos quadros, feios temas. Fotos de Sebastião Salgado mostram,
em rostos e corpos, na pele e nos olhos, na seca e ao sol, o pavor da fome e da aids: belas fotos – angústia e medo.


*Grifos meus. Se quiser o livro/me manda uma mensagem que te envio: tamaracosta@gmail.com.

12.5.14


“Tenho uma experiência tão louca do divino que rirão de mim se eu a relatar”, Georges Bataille, A Experiência Interior


Será preciso admitir que os poetas sorvem, sem o saber, em um fundo comum a
todos os homens, singular pântano cheio de vida onde fermentam e se
recompõem sem parar os destroços e os restos das cosmogonias antigas, sem que

os progressos da ciência lhes provoquem uma mudança apreciável? André Breton, in La Clé des Champs



"... pois existe amoer e amor. Existe a pomba e existe a serpente." O livro da Lei cap.I, V.57

DEDICATÓRIA; com amor, uma bocetada para o leitor.
Hilda Hist

24.7.13

ah se fosse tua essa rua

No mundo moderno e contemporâneo, esse gesto de juntar ruínas e acordar mortos não é apenas negado pelo discurso dos vencedores e desvalorizado pela maioria, é também incômodo, inclusive para o próprio escritor: o poeta moderno, mesmo a contragosto, passou a ser uma "soma teimosa do que não existe", como diz um verso de Jorge de Sena, um homem que impõe aos outros homens a sua "visão profunda" e que vive "vomitando verdades no ventre desses caciques empombados, dessas medusas emplumadas, vomitando o [seu] ouro no ventre rechonchudo e quente desses dinossauros", como reconhece desesperadamente o Ruiska de Hilda Hilst, porque essa visão, a visão que os dinossauros recusam, é o excesso do mundo em que vivemos, aquilo que sobre, os restos e destroços que ninguém quer ver, aquilo que se varre para debaixo do tapete.

Trecho do prefácio de Hilda Hilst e o seu pendulear, de Nilze Maria de Azeredo Reguera, disponível aqui para download gratuito.


22.7.13

Tudo é porta
                    tudo é ponte
agora caminhamos na outra margem
olha lá embaixo correndo o rio dos séculos
o rio dos signos
Olha correndo o rio dos astros
abraçam-se e separam-se voltam a unir-se
falam entre si uma língua de incêndios
suas lutas seus amores
são a criação e a destruição dos mundos

(...)

Octavio Paz, trecho do poema 'Noite em claro' (tradução de Claudio Willer, via Revista Agulha

16.7.13

seush cretinosh, não sejam tão hipócritash

"Todos nós conversamos e temos compreensões similares, e dizemos tudo que queremos, e falamos sobre nossos cus e nossos paus, e sobre quem nós comemos ontem a noite, ou quem vamos comer amanhã, ou que tipo de caso de amor nós temos, ou sobre quando ficamos bêbados, ou sobre quando enfiamos uma vassoura no cu no Hotel Ambassador em Praga - qualquer um fala com amigos sobre isso. E aí, o que acontece se você distingue o que fala com seus amigos do que fala com sua Musa? A questão é acabar com essa distinção: se aproximar da Musa para falar tão abertamente quanto falaria consigo mesmo ou com seus amigos. Daí, conversando com Burroughs, Kerouac e Gregory Corso, em conversas com pessoas que eu conhecia bem, cujas almas eu respeitava, comecei a perceber que o que estávamos realmente dizendo uns aos outros era totalmente diferente do que já existia em literatura. Essa foi a grande descoberta de Kerouac em On The Road. As coisas que ele e Neal Cassady falavam, ele finalmente descobriu, era a matéria-prima para o que ele queria escrever. Isso significava, naquele instante, uma completa modificação do que a literatura deveria ser na cabeça dele, e também nas cabeças das primeiras pessoas a ler o livro. Certamente, nas cabeças dos críticos, que num primeiro momento atacaram ele por não ser corretamente estruturado, ou algo assim. Trocando em miúdos, um bando de amigos andando por aí num carro. O que é obviamente como um excelente procedimento da literatura picaresca, e um dos clássicos. E não foi reconhecido na época como assunto literário pertinente." 

Allen Ginsberg, em A Arte da Poesia (entrevista). Geração Beat/ Org. Sergio Cohn, 2010.

8.7.13

"Ninguém pode se furtar à crença no poder mágico das palavras. (...) A confiança ante a linguagem é a atitude espontânea e original do homem: as coisas são seu nome. A fé no poder das palavras é uma reminiscência de nossas crenças mais antigas: a natureza está animada; cada objeto possui uma vida própria; as palavras, que são os duplos do mundo objetivo, são também animadas. (...) Algumas palavras se atraem, outras se repelem, e todas se correspondem. A fala é um conjunto de seres vivos, movidos por ritmos semelhantes aos que regem os astros e as plantas."


"A operação poética não é diferente do conjuro, do feitiço e de outros processos de magia. A atitude do poeta tem muita semelhança com a do mago. Ambos usam o princípio da analogia; ambos agem com fins utilitários e imediatos; não se perguntam o que é o idioma ou a natureza, mas servem-se deles para seus próprios fins. Não é difícil acrescentar outra característica: magos e poetas, diferentemente de filósofos, técnicos e sábios, extraem seus poderes de si mesmos."

 Octavio Paz, O Arco e a Lira, via Claudio Willer

28.6.13

"Vou para o Café dos Búzios.
Um sítio decrépito. Mas eu gosto. Gosto daquele desgosto. Gosto da
sujidade dos desgostos. Porque eu.
Eu amo a humanidade.
Mas eu. É assim, reúnem-se velhos, aqueles velhos a contar histórias
glaucas. Em que há sempre uma grande inocência. Morte. Solidão.
Há uma luz crua que vem de Lâmpadas nuas e nas paredes as foto-
grafias dos times de futebol ficam na parte mais sombria. Não sou
homem solitário, nunca fui. Sento-me perto deles, e eles sim, são soli-
tários, infinitamente sós, como sobras. E bebo quatro, cinco, seis, sete
cervejas, porque. Claro. Os bailarinos têm facilidade de eliminar o
álcool. Seis, oito horas de trabalho atlético. Mesmo se já não as faço.
A verdade é que não as faço. As luzes do palco. Nós. Não as senti-
mos nem conhecemos como o público as vê. Nós. Nunca poderemos
saber o que o público vê. O público não vê, sonha. O público sonha.
Que se foda o público. Detesto sonhos. Detesto sonhos. Sim? Não me
diga. Não me faça gritar! De resto é um dos problemas da vida: nada
é o que parece."
 
Mafalda Ivo Cruz, O rapaz de Botticelli. Lisboa: Dom Quixote. Via Letras de Hoje.

9.9.12

atención, mutación

Julio Cortázar. Buenos Aires, 1940. Archivo Aurora Bernárdez, Coll CGA (El Mundo)


"Cuando siento que voy a vomitar un conejito, me pongo dos dedos en la boca como una pinza abierta, y espero sentir en la garganta la pelusa tibia que sube como una efervecencia de sal de frutas. Todo es veloz e higiénico, transcurre en un brevíssimo instante. Saco los dedos de la boca, y en ellos traigo sujeto por las orejas a un conejito blanco. El conejito parece contento, es um conejito normal y perfecto, sólo que muy pequeño, pequeño como un conejito de chocolate pero blanco y enteramente un conejito. Me pongo en la palma de la mano, le alzo la pelusa con una caricia de los dedos, ele conejito parece satisfecho de haber nacido y bulle y pega el hocico contra mi piel..."

Carta a una senõrita de Paris, Julio Cortázar.

12.5.12

"[...]Como diz Edoardo Sanguinetti: 'O Surreslismo é o fantasma que, com toda a justiça, persegue as vanguardas e lhes nega um sono tranquilo'. Com a costela do Kapitalismo foi criada a Panacéia Socialista. O Forró Nuclear é a medida da Riqueza das Nações. As soluções em poesia são individuais e não coletivas. Eu estou com Gilberto Vasconcelos: depois que joguei a obra completa de Marx pela janela, comecei a compreender o Brasil. Fora isto o seguinte: Poesia é uma forma de conhecimento que vê através de objetos opacos, como uma viagem de LSD e estados mediúnicos de levitação. [...]" Roberto Piva, todo poeta é marginal, desde que foi expulso da república de platão, via Recanto Marginal.

12.3.12

Alan Moore, Hilda Hilst, Julio Cortázar, as ideias e o fogo

ALAN MOORE: V FOR VENDETTA




HILDA HILST: POEMAS AOS HOMENS DO NOSSO TEMPO I
homenagem a Alexander Solzhenitsyn

Senhoras e senhores, olhai-nos.
Repensemos a tarefa de pensar o mundo.
E quando a noite vem
Vem a contrafacção dos nossos rostos
Rosto perigoso, rosto-pensamento
Sobre os vossos atos.

A muitos os poetas lembrariam
Que o homem não é para ser engulido
Por vossas gargantas mentirosas.
E sempre um ou dois dos vossos engulidos
Deixarão suas heranças, suas memórias

A IDÉIA, meus senhores

E essa é mais brilhosa
Do que o brilho fugaz de vossas botas.

Cantando amor, os poetas na noite
Repensam a tarefa de pensar o mundo.
E podeis crer que há muito mais vigor
No lirismo aparente
No amante
Fazedor da palavra

Do que na mão que esmaga.

A IDÉIA é ambiciosa e santa.
E o amor dos poetas pelos homens é mais vasto
Do que a voracidade que nos move.
E mais forte há de ser
Quanto mais parco
Aos vossos olhos possa parecer.
(pág. 250, HILDA HILST - Obra poética reunida).




"Que conciliação é essa sem a qual a vida não passa de uma obscura piada? [...] se há conciliação, tem de ser outra coisa que não um estado de santidade, estado excludente desde o início. Tem de ser algo imanente, sem sacrifício do chumbo pelo ouro, do celofane pelo cristal, do menos pelo mais; a insensatez, ao contrário, exige que o chumbo valha o mesmo que o ouro, que o mais esteja no menos. Uma alquimia, uma geometria não-euclidiana, uma indeterminação up to date para as operações do espírito e dos seus frutos. Não se trata de subir, de decantar, de resgatar, de escolher, de livre-arbitrar, de ir do alfa ao ômega. Já se está. Qualquer um já está. O disparo está na pistola; mas é preciso apertar o gatilho, e o dedo está fazendo sinais para fazer parar o ônibus ou qualquer coisa assim".
(pág. 507, JULIO CORTÁZAR, O Jogo da Amarelinha, Círculo do Livro: 1968).