21.4.07

Em cadeia...

"Tenho um conhecido, por exemplo... Mas senhores! Claro que ele é vosso conhecido também, não há ninguém que não o conheça. Quando se prepara para uma ação, esse cavalheiro logo vos explica exatamente, com elegância e clareza, como deverá agir em consonância com as leis da razão e da vontade. E mais: falar-vos-á animada e apaixonadamente dos verdadeiros interesses normais do homem, zombará com ironia dos idiotas de vistas curtas que não percebem seus próprios interesses, nem o valor real da virtude. Mas, um quarto de hora depois, sem nenhuma súbita provocação externa, simplesmente obedecendo a algum impulso interior mais forte que todos os seus interesses, partirá para uma jornada inteiramente diferente - isto é, agirá contrariamente a tudo o que acabara de dizer sobre si mesmo, contra as leiz da razão, contra o seu próprio interesse, numa palavra, contra tudo... Previno-vos que meu conhecido é uma personalidade múltipla, pelo que se torna difícil condena-lo individualmente. O fato é, senhores, que deve realmente existir alguma coisa mais cara a quase todo homem do que seus maiores interesses, ou (para não violar a lógica), sempre há um interesse interessante (aquele único omitido de que falamos a pouco) que é mais importante e mais interessante que todos os interesses, pelos quais o homem, se necessário, estará pronto a investir contra todas as leis, ou seja, contra a razão, a honra, a paz, a prosperidade – em suma, contra todas essas coisas belas e úteis, desde que possa atingir aquele interesse fundamental que lhe é mais caro que todos os demais."

(Trecho ursurpado de 'Notas do suterrâneo', de Fiodór Dostoievski, para fins de pura obscenidade, digo, perturbação)



Tem uma coisa nas gentes
que o medo ou a vergonha
ainda não foram capazes de mascarar:
o cheiro.